fevereiro 12, 2011

ah...os dias.



(hoje, nada aconteceu. nem mesmo a cidade se insinuou)

(imag Net)


há dias assim
doentes
ausentes
sem gosto por mim


sem palavras nem ventos
nem encantamentos
nada me cativou
quedei-me à porta de mim


há dias assim

doídos
feridos
fingidos
mascarados de noites
fugidos
de mim

(maria)

fevereiro 06, 2011

Dá-me um cigarro?!!

(image: Munch: O Grito)
 


Levanto o olhar até ai preso nos buracos da calçada, que são muitos e sempre prontos a humilharem-me.
Dou de olhos com ele, muita cor castanha naquela figura franzina. Está estanque, inquisitivo, à minha frente. Os seus olhos, em frincha, brilhantes,  percorrem-me, avaliam-me, queimam-me.
Novamente atira-me:
- dá-me um cigarro?.....um cigarro?!! dá-me um cigarro?!!!
Ouço a minha voz, patética, num sussurro:
- por acaso não tenho...mas... um cigarro... não faz bem... é caro...e muito complicada...está a vida...
- o que é que vale um cigarro..?! Eu é que não "valo" nada! Eu não valo" nada, nada... de nada mesmo!
- não... não diga isso, vale sim, todas as pessoas são importantes...
- nãooo!! eu não "valo" nada! a Dra. vale! olhe o seu casaco, a sua mala, esse cachecol... a Dra vale...agora, eu?!! já viu, tenho 40 anos, não tenho casa , não tenho emprego, não consigo emprego, visto roupa que me dão, não tenho família, não roubo, mais valia roubar, sou jeitoso... já viu, Dra? eu sou bonito, não sou? mas nem consigo arranjar namorado e olhe que não tenho sida, nem essas doenças, viu, não "valo" nada, de nada! a Dra vale, ah vale, e o que vale um cigarro??????!!!!! mais vale roubar, ou matar... mais vale estar preso ou morto!
- Não, claro que vale... falava a minha voz a morrer lentamente.
Perante esta chuva em torrente de palavras arremessadas, imparáveis, e a moverem-se directas à fúria libertadora, forcei os ombros a elevarem-se, ensaiei um sorriso, embrulhei-o como pude, girei no calcanhar e afastei-me rapidamente, acenando não sei o quê com a cabeça.
Dez passos à frente, era em grito, aquele eu não valo nada, que ressoava, qual pedrada na calçada.
EU NÃO "VALO" NADA!

Dois dias passados e ainda ouço: EU NÂO "VALO" NADA!

(Estava um sol espaventoso. Eu fiquei com as mãos pesadas, cheias dele, e sem saber o que lhe fazer)

(maria)